(GP)
[2012]
O primeiro lugar: uma sala de espera da segurança social.
O segundo lugar: este onde se recorda uma sala de espera da segurança social. Dois
lugares, um livro. E uma imagem dentro de uma imagem. O livro, esse:
Eram os primeiros minutos do amanhecer. Simone
pensou que, se nas alturas não havia nada de interessante, teria de o procurar
em terra firme. Ou já não precisaria de procurar nada? Ficou na cama
espreguiçando-se lentamente, com uma preguiça infinita, a observar as
partículas de pó que pairavam num raio de sol dentro do seu quarto às escuras.
E foi então que ouviu o grito. Alguém tinha gritado no amanhecer, numa casa
próxima, talvez no seu próprio prédio, talvez no seu próprio quarto. Para
Simone, foi o mais semelhante a uma catarse, porque sentiu a sensação de que no
seu despertar ia existir um antes e um depois daquele grito. Logo a seguir, viu
que não seria assim. O grito tinha passado e continuava tudo na mesma, cinzento
e monótono como antes. Regressou ao seu tédio e chegou a uma firme conclusão,
sem que previamente se tivesse dedicado a procurá-la. A partir daquele momento,
enfrentaria directamente a verdade e suportaria o vazio e, por conseguinte,
aceitaria a morte. Bem vistas as coisas, pensou, a verdade encontra-se do lado
da morte, sempre o disse. Logo depois, voltou às partículas de pó, àquela espécie
de poesia do invisível. Irei mais além da preguiça do infinito, disse para
consigo. Era essa a sua meta na plenitude do seu magnífico despertar de morta.
Porque tinha despertado morta, espreguiçando-se suavemente ociosa, esplendorosa.
“Um tédio magnífico” (in Exploradores do Abismo),
Enrique Vila-Matas. Tradução de Jorge Fallorca. Teorema.
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